quarta-feira, 9 de julho de 2008

Doutora em MPB

No mês passado, a Berklee College of Music, uma das principais instituições culturais americanas, concedeu o título de "doutor" a algumas personalidades do meio musical. Entre os agraciados estavam o compositor canadense Howard Shore, Oscar de melhor trilha sonora de 2001 e 2003 pelos temas de O Senhor dos Anéis; Philip Bailey e Maurice White, integrantes do grupo Earth Wind & Fire; e a cantora baiana Rosa Passos. Rosa, que está lançando o disco Romance, é uma das raras intérpretes brasileiras que de fato fazem sucesso no exterior. "Meus discos são fonte de pesquisa dos estudantes e professores de Berklee", diz. O sucesso dessa artista de 56 anos não se resume ao campus. Ela coleciona elogios de astros do primeiro escalão, como o baixista de jazz Ron Carter e o violoncelista erudito Yo-Yo Ma ("Rosa tem a voz mais linda que ouvi", diz). O jornal The New York Times e a revista The New Yorker elogiam seus trabalhos, rotulando-a como "João Gilberto de saias". "Gosto do título, mas meu trabalho não se resume a cantar músicas de João." O sucesso de Rosa no exterior ainda não se refletiu no mercado brasileiro. Ela sempre lançou discos por selos pequenos. Além disso, trabalha na fronteira entre dois gêneros envelhecidos – a MPB clássica e o jazz. Mas é preciso prestar atenção quando alguém revisita o repertório tradicional com tanta personalidade, inteligência e força. Rosa não é uma daquelas cantoras que fazem música para estrangeiro ouvir nem uma artista que buscou pateticamente "o sucesso lá fora". Simplesmente, canta bem. Romance é um disco em que técnica e emoção convivem harmoniosamente. E, por mais que as canções tenham sido gravadas por outros autores, ela sempre dá um jeito de adaptá-las ao seu universo. É o que acontece com Atrás da Porta. Para muitos, a versão definitiva da canção de Francis Hime é aquela gravada em 1972 por Elis Regina, cujo canto desesperado foi imitado por outras intérpretes. Rosa a transforma numa outra canção. Sua Atrás da Porta é mais contida, porém não menos sofrida. "Eu torturo a banda, quebro a cabeça. Mas não aceito copiar uma fórmula." Rosa despontou em 1972, quando foi vencedora de um festival de música. Em 1979, lançou o primeiro disco. E então passou doze anos sem pisar no estúdio, cantando esporadicamente. Dedicou-se a criar os filhos em Brasília, para onde se mudou com o marido, Paulo Sérgio Passos, funcionário público de carreira que se tornou ministro dos Transportes nos meses finais do primeiro mandato do presidente Lula. "Meu marido é um sujeito honesto e trabalhador. Isso é o máximo que falo sobre política", diz a cantora. Rosa educou os filhos e sobreviveu à aridez de Brasília. Em 1993, gravou o CD Festa – que começou a espalhar seu nome pelo mundo. Romance está nas primeiras posições da parada de jazz dos Estados Unidos. Espera-se que essa cantora singular finalmente seja reconhecida no Brasil.

Doutora em MPB