segunda-feira, 2 de abril de 2007

Francês polivalente

Yann Tiersen é um dos melhores compositores pop da atualidade. Vocês devem conhecer este frânces de 43 anos pelos temas de Amélie Poulin e Adeus, Lênin, mas ele tem seis discos de carreira onde conta com a participação de gente como Jane Birkin e Elizabeth Fraser (do Cocteau Twins). Eu o entrevistei por email. No papo, Tiersen vai de trilhas sonoras à sua paixão pela sonoridade pós punk.

O sucesso da trilha sonora de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (2001) fez com que os temas do filme fossem tocados nos mais diferentes programas e comerciais. No Brasil, por exemplo, ele virou trilha sonora de um especial sobre grávidas. Qual foi a principal inspiração para criar a música? O senhor já se deparou com o uso dela em algum programa, digamos, inusitado?
Yann Tiersen — Na trilha sonora de Amélie Poulain há somente três músicas novas. As outras já existiam. Tinha quatro álbuns lançados quando participei dessa trilha. Portanto, diria que foi sobretudo o diretor Jean-Pierre Jeunet quem se inspirou escutando meus discos para ter vontade de buscar dentro deles (e extrair) certas faixas para colocar em seu filme. Com respeito à utilização das músicas em outros projetos, não podemos controlar tudo. E, às vezes, há alguns abusos. Por exemplo: nunca dei autorização para que minha música fosse utilizada nesse especial sobre grávidas ou qualquer publicidade brasileira! Fiquei muito surpreso com o que o senhor me contou.

Seus discos trazem uma grande influência de música clássica. Les Retrouvailles tem participação da Orquestra de Paris e uma das faixas conta com um belo arranjo de cravo. O senhor tem um passado como músico erudito? Como foi parar na música pop?
Yann Tiersen — Aprendi a tocar piano e violino no conservatório, entre os 6 e os 13 anos. Mas isso é tudo. Escuto pouca música clássica. O rock sempre foi minha principal influência. Os primeiros discos que comprei nos anos 80 e me deram vontade de escrever minha própria música foram dos grupos Bauhaus, Joy Division, The Stooges, Velvet Underground. Sempre fiz parte de grupos de rock antes de fazer meus próprios discos. Nos anos 90, estávamos digerindo a eletrônica dos anos 80, éramos muitos a querer redescobrir novas coisas mais naturais. Para encontrar meu caminho, passei por criações muito mais acústicas, mas a energia era a mesma. Nos anos 90, o frescor vinha da redescoberta dos instrumentos acústicos. Mas a roda vira e, neste momento, encontro mais facilmente na eletricidade. O que eu apresento no palco atualmente com meus músicos é muito elétrico, com conotação roqueira. Muita guitarra, muito pouco de violino e acordeão, sem piano.

Outra trilha sonora feita pelo senhor foi a de Adeus, Lênin! (2003). A trama é bastante diferente da de Amélie Poulain, mas os temas também são singelos. Como funciona o processo de criação de trilha sonora? Existe uma conversa prévia com o diretor da produção, o senhor chega a assistir ao filme antes de iniciar o processo de composição?
Yann Tiersen — As músicas de filme são um grande mal entendido, porque não sou um compositor de trilhas. Penso que há muitos outros compositores mais competentes do que eu para escrever esse tipo de música. Preciso demais da liberdade, de não saber para onde vou. Se analisarmos bem, ao todo, fiz somente uma trilha — visto que em Amélie foram usadas músicas de meus discos precedentes — e seis discos de estúdio... Para Adeus, Lênin!, realmente compus temas inéditos. De qualquer forma, não costumo trabalhar em função das trilhas. Primeiramente, preciso de um roteiro que me agrade, uma história. Depois, que algo emane do encontro com o diretor do filme. E que eu me sinta livre para compor sozinho, sem alguém atrás de mim ditando regras. Caso não sinta essas condições, prefiro dizer não de cara. Eu não poderia fazer nada neste contexto.
O senhor trabalhou com a cantora inglesa Shannon Wright e, recentemente, saiu em turnê ao lado de Elizabeth Fraser, vocalista do Cocteau Twins. Poderia nos dizer como foi a experiência?
Yann Tiersen — Essa experiência com Shannon foi muito boa. Fizemos um disco juntos com muita rapidez. Ela foi trabalhar na minha casa e tudo correu bem. Em seguida, fizemos quatro concertos no festival Les Transmusicales, de Rennes (na França). Tínhamos pouco tempo disponível em nossas agendas respectivas, mas tudo foi muito simples. Fluía facilmente. Não cheguei a sair em turnê com Elizabeth Fraser. Ela gravou no meu último disco de estúdio, Les Retrouvailles, e cantou comigo num único concerto, transmitido por uma rádio francesa. Uma das músicas dessa apresentação está no meu disco On Tour e a outra, no meu DVD. Foi mágico trabalhar com ela.
A crítica inglesa costuma chamar de new chanson o movimento capitaneado pelo senhor, pelo cantor e compositor Benjamin Biolay e pela cantora Carla Bruni. O senhor acha esse rótulo restritivo ou sente-se confortável com ele?
Yann Tiersen — As etiquetas têm sempre algo de redutor, mas não cabe a mim catalogar minha música. É sempre instrutivo saber o que pensam de você; às vezes, pode ser enervante e sem nenhuma relação com o que quis passar. Ou ainda o inverso: pode me trazer um outro olhar e me fazer refletir sobre meu trabalho.
Uma das releituras feitas pelo senhor é a de Life on Mars, de David Bowie. Poderia dar maiores detalhes sobre esta escolha? Costuma tocá-la em suas apresentações ao vivo? Bowie é uma influência?
Yann Tiersen — Como sempre escutei rock e música anglo-saxã, obrigatoriamente passei por Bowie. Assim como todo mundo, suponho. Life on Mars eu toquei com Neil Hannon (vocalista do grupo inglês Divine Comedy) uma vez num programa de rádio, na época em que meu disco Le Phare estava sendo lançado. O que aconteceu é que essa performance foi gravada e, em seguida, incluída como faixa-bônus do mesmo CD. Mas nunca a toco nos meus shows.

2 comentários:

Renata D'Elia disse...

Ele estava na Argentina, dia desses?

Sergio Martins disse...

Sim, Renata, ele foi de São Paulo direto para Buenos Aires. Olha, foi um showzaço.